Cama compartilhada: o amor que sufoca (e a culpa que ninguém quer sentir)
A ciência já sabe: os primeiros anos de vida são fundamentais para a formação do apego, da sensação de segurança e da regulação emocional do bebê.
Dormir com os pais pode, sim, gerar conforto e fortalecer o vínculo.
MAS…
A longo prazo, a cama compartilhada pode gerar confusão psíquica, dificultar a autonomia, interferir na construção da individualidade da criança - e no casal também.
Psicanaliticamente falando:
A cama dos pais é um espaço simbólico de separação entre o casal e os filhos.
Quando a criança permanece por anos nesse espaço, o processo de castração simbólica (a percepção de que não somos um com o outro, e sim dois seres diferentes) fica comprometido.
Isso pode gerar uma dependência emocional disfarçada de amor.
Neurocientificamente:
Crianças que não aprendem a dormir sozinhas tendem a ter mais dificuldade de regular o sono, o humor e a frustração.
O sono interrompido e o excesso de estímulos noturnos elevam os níveis de cortisol, o hormônio do estresse.
Por que é tão difícil sair da cama compartilhada?
Porque, muitas vezes, não é o filho que tem dificuldade de dormir sozinho.
É a mãe que tem dificuldade de deixá-lo ir.
É sobre apego.
Medo.
Culpa.
Sentimento de que “só ali” ele está seguro.
E claro: há também os despertares noturnos que fazem tudo parecer mais difícil ainda.
Mas saiba:
uma criança que dorme sozinha não é menos amada.
Ela é amada com estrutura e limites.
Se você entrou aqui procurando ajuda para sair da cama compartilhada, não se preocupe que transmitirei todas as dicas que aprendi sobre! Mas antes, quero te pedir licença para acessar o seu coração e quero que você reflita comigo:
Seu filho não consegue dormir sozinho… ou é você que não consegue deixá-lo ir?
Essa parte pode doer.
Mas ela é necessária.
A criança está ali porque precisa…
ou porque você precisa dela ali?
Muitas vezes, a cama compartilhada se prolonga não pela vontade da criança, mas pela necessidade inconsciente da mãe de preencher um vazio emocional.
Medo de ficar sozinha.
Crise conjugal não resolvida.
Um parceiro ausente (ou emocionalmente distante).
A criança como barreira física e emocional entre o casal.
Ou até um medo inconsciente de que, ao permitir que a criança durma no próprio quarto, ela “deixe de ser seu bebê”.
💬 “Mas ele chora quando eu coloco no quarto…”
Certo. E você chora quando não tem o controle?
Se a criança virou barreira no casal, o problema não é o filho.
Quando a criança ocupa a cama do casal, muitas vezes ela está apenas representando o que já está disfuncional ali.
A criança simboliza:
A fuga da intimidade.
O fim do diálogo entre o casal.
A ausência de prazer, de carinho, de olhar um pro outro.
O lugar do filho é dentro do quarto dele.
Não entre o casal.
✅ O caminho começa com coragem. E pode ser simples:
Reconheça com honestidade o que te prende à cama compartilhada.
Converse com seu parceiro sobre a importância de resgatar o espaço conjugal.
Crie o projeto de transição juntos, com apoio mútuo - porque esse é um movimento de família, não só da criança.
Cuide da intimidade com o mesmo zelo que cuida do seu filho.
Uma relação amorosa saudável é o maior presente que você pode dar pra ele.
E agora, como ensinar a criança a dormir no próprio quarto - sem traumas?
Crie um ritual de sono previsível
Banho, história, música calma, apagar as luzes. A rotina dá segurança.Comece dormindo com ela no quarto dela
Vá fazendo o movimento de sair aos poucos, não de uma vez.Evite levar de volta pra sua cama durante a madrugada
Se ela aparecer, acompanhe de volta ao quarto dela com firmeza e carinho.Ofereça segurança emocional de dia também
Criança que recebe atenção, afeto e previsibilidade durante o dia dorme melhor à noite.Prepare-se para o choro, a resistência, os pedidos
Não ceda no primeiro “por favor”.
O que parece amor, muitas vezes, é um teste de limite.
E o limite dado com doçura é o maior cuidado que você pode oferecer.
E como eu lidei com os despertares noturnos da minha filha?
A minha filha sempre dormiu no seu proprio quarto. Porém, teve uma fase em que acordava todas as noites e vinha direto pra minha cama.
E sim, eu deixava.
Até que eu percebi que aquilo não estava saudável nem pra mim, nem pra ela.
O que eu fiz?
Um simples combinado.
Expliquei pra ela que poderia vir dormir toda sexta-feira, mas que teria que dormir no cantinho dela.
Pouco tempo depois, ela mesma passou a voltar pra cama dela sozinha.
Sem pressão.
Sem trauma.
Com amor.
Mas com direção.
Conclusão: amar também é deixar ir.
Não é sobre ser contra ou a favor da cama compartilhada.
É sobre reconhecer quando isso já não é mais amor, é dependência.
Seu filho precisa de você.
Mas precisa ainda mais de um espaço seguro para se desenvolver sozinho.
E você precisa da sua cama, do seu parceiro (se tiver um), da sua individualidade.
Não há culpa nisso. Há coragem.
E se precisar de ajuda para dar esse passo, estou aqui.
Vamos juntas?
JB.